Polícia alemã ignorou pista de atropelamento no caso Maddie apesar de alerta feito em 2018
Uma pista considerada credível que apontava para a possibilidade de Madeleine McCann ter sido vítima de um atropelamento foi ignorada pelas autoridades alemãs, que se recusaram a colaborar com a Polícia Judiciária (PJ) na investigação dessa linha alternativa ao desaparecimento da menina inglesa, ocorrido há 18 anos na Praia da Luz. A revelação surge numa altura em que terminaram mais três dias de buscas intensivas em Portugal, desta vez coordenadas pelas autoridades alemãs, mas sem resultados concretos.
Tudo começou em 2018, quando uma cidadã britânica contactou a polícia do Reino Unido para expressar suspeitas sobre o envolvimento do seu irmão no desaparecimento de Madeleine. Segundo a mulher, o irmão, alcoólico, passou a comportar-se de forma estranha desde maio de 2007, como se carregasse “um penoso segredo”. As autoridades britânicas partilharam a informação com a PJ, que encontrou uma coincidência com um depoimento recolhido em 4 de maio de 2007, no dia seguinte ao desaparecimento da criança.
Nesse depoimento, uma mulher relatava ter ouvido discussões violentas entre um casal vizinho — ele inglês, ela alemã, ambos alcoólicos. O homem gritava repetidamente: “Porquê que a trouxeste?”. Só mais tarde se perceberia que se tratava do mesmo indivíduo denunciado pela irmã. A mulher alemã teria passado essa noite a beber num café junto ao complexo Ocean Club, onde a família McCann estava alojada. Testemunhas relataram ainda ter visto um carro, semelhante ao conduzido por essa mulher, onde seguiam uma criança e uma mulher, à hora do desaparecimento.
Perante estas informações, a PJ equacionou a hipótese de atropelamento acidental e de posterior ocultação do corpo, em pânico. Propôs então ao Ministério Público alemão a realização de uma operação encoberta — nomeadamente infiltrar um agente para se aproximar da mulher e obter uma eventual confissão. Contudo, o procurador alemão recusou autorizar a ação, optando por seguir exclusivamente a linha de investigação centrada em Christian Bruckner, atualmente considerado o principal suspeito pelas autoridades da Alemanha.
As recentes buscas na zona da barragem do Arade, no Algarve, foram realizadas precisamente por solicitação da polícia alemã. Durante três dias, inspetores da PJ, sob supervisão de elementos alemães, vasculharam mais de cinco hectares de terreno, onde Bruckner, que está preso por violação de uma turista americana em 2005, fazia campismo selvagem. A operação incluiu o uso de drones, georadares, retroescavadoras e inspecções a pé por trilhos e casas abandonadas. No entanto, segundo informações obtidas pelo Correio da Manhã, não foram encontrados vestígios relevantes relacionados com Maddie. Apesar disso, alguns objetos recolhidos seguem agora para análise laboratorial.
Christian Bruckner cumpre pena na Alemanha, mas poderá ser libertado ainda este ano. Já foi absolvido noutros processos por abuso sexual alegadamente ocorridos em Portugal, devido à falta de provas e à ausência de identificação de vítimas. A polícia alemã procura agora travar a sua libertação, apostando todas as fichas na ligação ao caso McCann. No entanto, se nenhuma nova evidência surgir, o suspeito poderá mesmo sair em liberdade.
A colaboração da PJ, apesar de a investigação do atropelamento não ter sido considerada prioritária, foi total. A polícia portuguesa, liderada por Luís Neves, acompanhou e executou todas as diligências solicitadas pelas autoridades alemãs. A cidadã britânica que denunciou o irmão foi submetida a avaliações médicas e psicológicas, tendo os profissionais atestado a credibilidade do seu testemunho.
O homem apontado pela irmã como possível envolvido no desaparecimento de Madeleine morreu entretanto. Nunca confirmou nem negou à irmã qualquer envolvimento no caso. A recusa das autoridades alemãs em explorar esta pista deixa em aberto a possibilidade de uma oportunidade de investigação relevante ter sido negligenciada.