Parlamento Europeu ameaça processar a Comissão por plano de defesa de 150 mil milhões que exclui eurodeputados

O Parlamento Europeu está em rota de colisão com a Comissão Europeia devido ao programa SAFE, uma iniciativa que visa mobilizar até 150 mil milhões de euros através de empréstimos para financiar investimentos em defesa nos Estados-membros. A presidente do Parlamento, Roberta Metsola, enviou uma carta à presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, na qual contesta a base legal escolhida para o projeto e ameaça recorrer aos tribunais europeus caso o executivo avance sem envolver os eurodeputados.

O programa SAFE – Strategic Technologies for Europe Platform for Defence — insere-se na estratégia “Readiness 2030”, apresentada pela Comissão, que pretende acelerar os investimentos em defesa no espaço europeu, numa altura em que aumentam os receios de uma possível agressão por parte da Rússia nos próximos anos. O plano prevê que a Comissão angarie até 150 mil milhões de euros nos mercados financeiros, valores que seriam posteriormente emprestados aos Estados-membros para reforço das suas capacidades militares.

Contudo, a forma como a Comissão pretende implementar o programa tem gerado forte oposição no Parlamento. O executivo europeu propôs recorrer ao artigo 122.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), um mecanismo excecional que permite adotar medidas rápidas em resposta a situações de emergência, como “graves dificuldades no aprovisionamento de certos produtos” ou catástrofes naturais e eventos excecionais fora do controlo dos Estados.

Na missiva enviada a Von der Leyen, e citada pela Euronews, Metsola sublinha qye a Comissão dos Assuntos Jurídicos (JURI) do Parlamento Europeu decidiu “por unanimidade”, no mês passado, que o artigo 122.º “não é a base legal apropriada para o regulamento proposto”.

A presidente do PE reforça que os eurodeputados “não estão a questionar o mérito da proposta”, mas sim a alertar que avançar sem a devida base jurídica comprometeria “a legitimidade democrática ao enfraquecer as funções legislativas e de escrutínio do Parlamento Europeu”.

Nesse sentido, Metsola apelou a Von der Leyen para que “reconsidere a escolha da base legal” do regulamento, de forma a garantir a participação de ambos os colegisladores — Parlamento e Conselho. A presidente do hemiciclo deixa ainda um aviso: caso o Conselho aprove o regulamento com base no artigo 122.º, o Parlamento “avaliará” o exercício do seu direito de interpor uma ação judicial junto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

Comissão defende posição e invoca “circunstâncias excecionais”
Confrontado com as críticas, um porta-voz da Comissão Europeia defendeu a escolha do artigo 122.º. “A Europa enfrenta uma ameaça de segurança sem precedentes”, afirmou Thomas Regnier à Euronews, acrescentando que, como já declarado por Von der Leyen nas suas Orientações Políticas, o artigo 122.º “só será utilizado em circunstâncias excecionais, como as que vivemos atualmente”.

Este artigo do TFUE tem sido utilizado em situações de emergência anteriores, nomeadamente durante a pandemia de COVID-19 e, mais recentemente, para acelerar autorizações no setor das energias renováveis, no auge da crise energética.

Segundo Andrius Kubilius, comissário europeu responsável pelas áreas da Defesa e do Espaço, o Conselho da UE poderá aprovar o regulamento do SAFE até ao final deste mês. Uma vez aprovado, os Estados-membros terão dois meses para apresentar os seus pedidos de financiamento, sendo que a Comissão disporá de mais quatro meses para os avaliar.

Este calendário sugere que as primeiras tranches do programa SAFE poderão ser desembolsadas ainda antes do final do ano.

Apesar das críticas e ameaças legais, a Comissão parece determinada a avançar com este plano considerado fundamental para a segurança europeia, enquanto o Parlamento insiste na necessidade de respeitar os princípios democráticos e o processo legislativo ordinário da União.






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