
Ataques de tubarões estão a aumentar… e a culpa é das selfies
Um novo estudo científico aponta para um fenómeno preocupante nas interações entre humanos e tubarões: o aumento dos ataques destes animais não se deve a comportamentos predatórios, mas sim a reações de defesa face a intrusões humanas, muitas vezes protagonizadas por influenciadores digitais em busca da selfie perfeita. A investigação, publicada na revista Frontiers in Conservation, analisa mais de uma década de incidentes e conclui que o verdadeiro perigo reside nas atitudes humanas, não nos tubarões.
O estudo centrou-se na análise de dados recolhidos na Polinésia Francesa entre 2009 e 2023, onde se registaram 74 mordidas de tubarão. Os investigadores descobriram que a maioria destes episódios não teve motivações alimentares ou agressivas, mas foram reações defensivas por parte dos tubarões. Eric Clua, autor principal da investigação e professor na Universidade PSL, em Paris, afirmou que “os tubarões não estão a atacar para se alimentar. Estão a defender-se de interações indesejadas”.
Numa análise mais vasta, com recurso à base de dados internacional Shark Attack Files, foram identificados mais de 300 incidentes semelhantes em todo o mundo. A maioria resultou apenas em ferimentos ligeiros, reforçando a ideia de que os tubarões não estavam a caçar humanos, mas a afastá-los.
“Não toque. Basta olhar”, resume Clua. “Apreciem a beleza [dos tubarões], mas lembrem-se que são animais selvagens. Não se trata apenas de uma questão de segurança, mas também de respeito”.
Apesar dos apelos dos especialistas, continua a crescer o número de vídeos e fotografias virais que mostram pessoas a interagir perigosamente com tubarões. Influenciadores conhecidos como Taylor Cunningham, e até conservacionistas como Andriana Fragola, partilharam conteúdos nas redes sociais onde são vistos a acariciar tubarões, segurar nas barbatanas ou posar em grande plano com os animais — comportamentos que foram fortemente criticados por encorajarem interações irresponsáveis e desrespeitosas.
Casos graves aumentam: selfies com consequências trágicas
As consequências destas acrobacias digitais já se revelaram trágicas. De acordo com a Vice, um turista canadiano perdeu as duas mãos ao tentar tirar uma selfie com um tubarão. Noutro caso, um pai de quatro filhos, em Israel, foi mortalmente atacado enquanto filmava tubarões na natureza. Estes incidentes reforçam os avisos da comunidade científica sobre os riscos da aproximação excessiva à vida selvagem.
Eric Clua destaca ainda um erro comum entre o público: a falta de distinção entre as várias espécies de tubarões. “As pessoas compreendem bem a diferença entre um Yorkshire terrier e um pitbull, mas não aplicam essa mesma lógica aos tubarões. E isso pode ser fatal”, sublinha o investigador.
Nem todas as espécies apresentam o mesmo nível de perigo. No entanto, a generalização leva muitos banhistas e mergulhadores a aproximarem-se de animais potencialmente perigosos, sem perceberem o risco que correm — nem o impacto negativo que têm sobre os próprios tubarões.
O estudo também procura desmistificar a ideia de que os tubarões são uma ameaça constante para os seres humanos. Em termos globais, os ataques de tubarões resultam em menos de 10 mortes por ano, enquanto, por comparação, os cães domésticos são responsáveis por milhares de mortes anualmente.
Este dado, embora frequentemente ignorado pela opinião pública, é fundamental para mudar a narrativa em torno destes animais marinhos, que continuam a ser retratados como predadores implacáveis em filmes e redes sociais.
O estudo termina com um apelo à reflexão sobre a forma como os humanos se relacionam com a vida selvagem. “Na era da obsessão com a visibilidade online, é fundamental que as pessoas compreendam que os comportamentos de risco, por mais impressionantes que pareçam num vídeo, têm consequências reais — para os próprios e para os animais envolvidos”, concluem os autores.
Assim, os investigadores defendem que seja promovida uma nova cultura de respeito pelos ecossistemas marinhos, com regras claras de conduta para turistas, mergulhadores e criadores de conteúdo digital. O simples gesto de manter distância pode ser a diferença entre uma experiência inesquecível e uma tragédia evitável.